A festa do Oscar 2016, celebrada domingo passado, trouxe algumas surpresas e muitas certezas. Entre elas, a vitória de Brie Larson como melhor atriz… Seguida de perto por um coletivo “quem é Brie Larson” por boa parte do público. Atrizes pouco conhecidas garfando um prêmio da Academia não são novidade (Marlee Matlin e Hilary Swank, por exemplo). Mas poucas podem dizer que uma estatueta dourada é apenas o começo de um caminho verdadeiramente brilhante. O oráculo aqui aposta que será este o caso de Brie Larson (repetição totalmente proposital, vamos decorar o nome da moça). Essa californiana de 26 anos mirou em um equilíbrio entre as carreiras de cantora e atriz antes de abraçar uma carreira na TV, alguns papéis de coadjuvante no cinema antes de apontar como protagonista em O Quarto de Jack, que lhe rendeu o Oscar. Mais do que merecido, diga-se.
Neste drama sombrio, que pena para encontrar alguma luz, ela se sobressai como a mãe de um garotinho de 5 anos, que há sete se vê prisioneira em uma cabana. Com a liberdade, vem uma mistura de alívio e culpa, depressão e euforia, e Brie consegue transmitir cada emoção com um olhar, um gesto, despida de vaidade e contando com o melhor sparring na pele do pequeno (e adorável, quem o viu na festa do Oscar comprovou) Jacob Tremblay. Foi uma escolha brilhante feita por uma atriz segura de suas habilidades, que não hesitou em mergulhar no mundo criado pelo diretor Lenny Abrahamson.
Com Jacob Tremblay em O Quarto de Jack
Antes de O Quarto de Jack, a carreira de Brie Larson (nascida Brianne Sidonie Desaulniers em outubro de 1989) era eclética e, honestamente, com pouco foco. Em 2003, vivendo com sua mãe e irmã em Los Angeles, ela começou a demonstrar interesse em música, soltando algumas composições na internet. Até então, ela havia molhado os dedos na TV, começando em alguns quadros no Tonight Show de Jay Leno em 1998, emendando com diversas pontas em séries variadas, de Touched By an Angel a Popular. Raising Dad, que teve duas dezenas de episódios no começo do século, foi o que mais se aproximou de uma carreira regular.Enquanto ela pipocava em pontas na TV e em papéis menores no cinema – como em De Repente 30, comédia de 2004 com Jennifer Garner –, a música chamou mais alto. Em 2005 Brie lançou seu primeiro disco, Finally Out of P.E., que lhe rendeu uma turnê com outros artistas adolescentes – “She Said”, porém, foi a única música que arranhou algum espaço nas rádios. Mal tinha chegado aos 20 anos e ela já podia se considerar uma veterana em cinema, TV e também como cantora. Mas, obviamente, era pouco – e Brie estava determinada a garantir seu espaço.
Os anos seguintes serviram para que ela acumulasse experiência, ainda que não fugisse do estigma de “coadjuvante bonitinha” que, ocasionalmente, contribuia com alguma canção para a trilha de seus filmes. E Brie cresceu aos olhos do público, aparecendo em mais de um filme a cada ano e diversificando seu portfólio na TV. A série United States of Tara, exibida entre 2009 e 2011, também serviu para ela redefinir sua imagem. Saiu de cena a mocinha bacana, modelo para adolescentes; em seu lugar entra uma jovem arrogante e ingênua, promíscua e egoísta, filha da personagem título (interpretada por Toni Collette) que sofre de múltiplas personalidades.
United States of Tara foi o primeiro palco para Brie demonstrar que suas habilidades dramáticas não estavam confinadas a um padrão e ela podia alçar vôos maiores. Essa mudança foi consolidada em 2013 quando ela caiu de cabeça no cinema independente. No festival de Sundance ela surgiu, ainda como coadjuvante, em Como Não Perder Essa Mulher (título horroroso para Don Jon, “dramédia” escrita, dirigida e protagonizada por Joseph Gordon-Levitt), e no delicioso O Maravilhoso Agora, dividindo a cena com Miles Teller e Shailene Woodley. Mas o jogo virou dois meses depois, no festival South by Southwest em Austin, Texas, quando ela finalmente protagonizou seu primeiro filme, o drama Short Term 12.
Short Term 12 foi seu primeiro filme como protagonista
No papel da supervisora de uma casa que abriga adolescentes problemáticos, Brie é o centro emocional do filme, alternando alegria e fúria, sorriso e lágrimas. É uma performance difícil e contida, que nas mãos de uma atriz menos capaz podia facilmente cair na caricatura. O reconhecimento veio por meio de uma dúzia de indicações e vitórias em diversos festivais de cinema, e marcou seu ponto de virada de coadjuvante bacana a performer capaz de “carregar” um filme, principalmente no ambiente confortável do cinema independente e longe da pressão monetária hollywoodiana.
Mas o cinemão, claro, não tardou a chamar. Mark Wahlberg chegou na frente, e escalou Brie para co-protagonizar o drama O Apostador, de 2014 (que eu comentei aqui). Dirigido por Rupert Wyatt, é uma refilmagem do longa dirigido por James Toback em 1974, com James Caan no papel-título, e acompanha a espiral descendente de um professor com uma compulsão por jogos que aos poucos mina sua vida. Brie surge como uma de suas alunas, também um prodígio em literatura, que trabalha como garçonete em uma casa de apostas que ele frequenta. Não é pouco dizer que a atriz é o ponto alto do filme, entregando uma performance poderosa ao lado de Wahlberg.
Com Mark Wahlberg em O Apostador
Embora 2015 tenha trazido a atriz em filmes tão diferentes como a dramédia indie Digging for Fire (ao lado de Orlando Bloom, Sam Rockwell e Anna kendrick) e o sucesso de bilheteria Descompensada (comédia com Amy Schumer e Bill Hader), foi mesmo em O Quarto de Jack que Brie depositou todo seu talento dramático. O Oscar foi consequência de um trabalho meticuloso de construção de personagem e de uma performance contida, multifacetada e hipnotizante.
O Oscar também pode ser uma armadilha, trazendo um peso capaz de ancorar uma carreira, se for conduzida de maneira apressada. Mas Brie Larson, apesar de parecer, não é uma novata que pode sucumbir ao deslumbre do careca dourado – a foto que ilustra esse texto, com ela de tênis e devorando um hamburguer, segurando o Oscar em plena festa da Vanity Fair, mostra que a atriz entende o humor da situação. Embora tenha um par de produções já na gaveta para este ano – que com certeza se beneficiarão do status de ter uma estrela oscarizada no elenco –, seu próximo filme para o mundo é Kong: Skull Island, super produção que a coloca no coração do mundo dos blockbusters, ao lado de Tom Hiddleston, Samuel L. Jackson e uma cota razoável de efeitos especiais. Menos ela, claro: Briel Larson é bem real.
Fonte: Uol